Mouras de Xisto

23-07-2023

Fui caminhar, logo no dia seguinte, pelos trilhos de xisto mesmo ao lado aqui de casa. A minha visão e o meu sentir estão diferentes desde ontem. As pedras falam bem alto, fazem-se notar. A Moura está aqui. A Moura sou.

Definitivamente, resiliente. Capaz de caminhar com todo o peso às costas. O peso de coisas que não servem mais e que têm de ser largadas.

Esta caminhada levou-me a sítios inesperados. Caminhei como Moura, pelas Mouras de xisto.

Segura-te

Segura-te a mim companheira

Estamos juntas na vida e na morte

Carregamos e somos carregadas

Absorvemos e emitimos

As tempestades vão e vêm

Nada é para sempre

Até nós nos partimos aos bocados

Não somos gigantes para sempre

Vamo-nos formando

Vamo-nos lascando

Temos um relacionamento caricato com os Javalis

Estamos aqui e comunicamos

Mas muitos não nos ouvem

A nossa essência é sempre a mesma, sejamos pequenas ou grandes

Estratos de luz, de espaços vazios entre o sólido

Sente a nossa luz na tua coluna

É a tua luz

A tua coluna é a nossa coluna

Nós somos uma coluna

Coluna da serra

Da serra do açor

Açor, aço

Em linha recta de aço que liga aqui aos Açores

Vê o mapa e vê a linha

Fazemos um triângulo também

Noutro país

Noutro continente

Aço forte

Espada de protecção

Sentes agora?

A magia destas Mouras, numa manhã de nevoeiro (vejam a lenda de Outeiro da Moura no livro), revelou-me que sim, como elas seguram, eu seguro. Que esse segurar não é uma limitação, mas o apoio ao sistema nervoso de cada mulher. Um segurar de segurança. Aquele abraço quando é necessário. Aquele aperto físico quando estamos espalhadas em emoções frenéticas. O corpo do nosso amado em cima do nosso - um peso que apoia, ama, cuida e nutre. O apoio de mim para mim. O amor de mim para mim. Um segurar das águas internas, essas emoções que todas sentimos. Um guiar das águas internas sem as conter. Um guiar das passadas escolhidas e não escolhidas conscientemente. As grutas que sustêm a nossa escuridão. Um lugar seguro.

As Mouras, hoje, mostraram-me segurança. 

Segurança que vem de dentro e segurança que vem de fora.


Fui para a internet pesquisar o tal outro ponto do triângulo do qual as Mouras de Xisto me falaram. Incrível o que descobri! Há um local chamado Açoriana no Brasil (Santa Isabel do Sul), em Rio Grande do Sul e Açores em Florianópolis (cerca de 800Km de distância um do outro).

E aqui temos o triângulo!

Agora quero senti-lo!