Mouras de Xisto
Fui caminhar, logo no dia seguinte, pelos trilhos de xisto mesmo ao lado aqui de casa. A minha visão e o meu sentir estão diferentes desde ontem. As pedras falam bem alto, fazem-se notar. A Moura está aqui. A Moura sou.
Definitivamente, resiliente. Capaz de caminhar com todo o peso às costas. O peso de coisas que não servem mais e que têm de ser largadas.
Esta caminhada levou-me a sítios inesperados. Caminhei como Moura, pelas Mouras de xisto.
Segura-te
Segura-te a mim companheira
Estamos juntas na vida e na morte
Carregamos e somos carregadas
Absorvemos e emitimos
As tempestades vão e vêm
Nada é para sempre
Até nós nos partimos aos bocados
Não somos gigantes para sempre
Vamo-nos formando
Vamo-nos lascando
Temos um relacionamento caricato com os Javalis
Estamos aqui e comunicamos
Mas muitos não nos ouvem
A nossa essência é sempre a mesma, sejamos pequenas ou grandes
Estratos de luz, de espaços vazios entre o sólido
Sente a nossa luz na tua coluna
É a tua luz
A tua coluna é a nossa coluna
Nós somos uma coluna
Coluna da serra
Da serra do açor
Açor, aço
Em linha recta de aço que liga aqui aos Açores
Vê o mapa e vê a linha
Fazemos um triângulo também
Noutro país
Noutro continente
Aço forte
Espada de protecção
Sentes agora?
A magia destas Mouras, numa manhã de nevoeiro (vejam a lenda de Outeiro da Moura no livro), revelou-me que sim, como elas seguram, eu seguro. Que esse segurar não é uma limitação, mas o apoio ao sistema nervoso de cada mulher. Um segurar de segurança. Aquele abraço quando é necessário. Aquele aperto físico quando estamos espalhadas em emoções frenéticas. O corpo do nosso amado em cima do nosso - um peso que apoia, ama, cuida e nutre. O apoio de mim para mim. O amor de mim para mim. Um segurar das águas internas, essas emoções que todas sentimos. Um guiar das águas internas sem as conter. Um guiar das passadas escolhidas e não escolhidas conscientemente. As grutas que sustêm a nossa escuridão. Um lugar seguro.
As Mouras, hoje, mostraram-me segurança.
Segurança que vem de dentro e segurança que vem de fora.
Fui para a internet pesquisar o tal outro ponto do triângulo do qual as Mouras de Xisto me falaram. Incrível o que descobri! Há um local chamado Açoriana no Brasil (Santa Isabel do Sul), em Rio Grande do Sul e Açores em Florianópolis (cerca de 800Km de distância um do outro).
E aqui temos o triângulo!
Agora quero senti-lo!